Certa vez, li uma série de artigos do blog Data Estelar sobre o jogo tema do blog, Starfinder. Os artigos destrinchavam o livro e explicavam o jogo.
Tomando como base esses artigos e uma análise rasa de diversos outros jogos que seguem o sistema d20, temos jogos voltados à resolução de conflitos através do combate. A personalização do personagem é voltada para habilidades que melhoram, prioritariamente, sua capacidade de combate, seja para causar dano, curar, prestar suporte ou controlar o campo de batalha. Regras para conflitos sociais ou exploração ficam em segundo plano e percebemos isso com poucas menções a esses pilares e poucas habilidades e equipamentos que servem a esse tipo de situação.
Saliento que essa análise é baseada numa pesquisa feita por alto, sem uma análise aprofundada livro por livro - como feita agora; e não estou levando em consideração os suplementos, apenas os livros básicos dos jogos que mais conheço: D&D 3.5, Tormenta RPG, M&M, Ação!!! e Primeira Aventura. Também não entrarei no mérito de questões editoriais, que levaram os jogos citados a serem o que são. Uns tendo grande suporte das editoras e equipes especializadas no assunto e outros feitos por equipes reduzidas, com foco no preço acessível do jogo e sua facilidade de adaptação Por fim, conflitos de autor, editora e direitos de produto.
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A capa dourada foi uma das coisas que mais me fascinou! |
E, com essa análise, direi do que se trata o 4D&T e porque prefiro ele a outros sistemas d20, também elencando seus pontos fortes e fracos. A versão do jogo a ser analisada é a "versão do diretor", lançada apenas em pdf, gratuitamente na internet, tempos depois do lançamento do livro físico. Portanto, com as devidas correções de regras e diagramação: é perceptível a mudança da diagramação das duas versões, a do diretor é mais sóbria e fácil de ler, a impressa possui edição grosseira e aparentemente feita às pressas.
"4D&T - Versão do diretor" possui 96 páginas, sendo: 10 capas e 3 extras (Como Preencher a Ficha de Personagem, Ficha de Personagem e Termos OGL). Essa versão não possui capa, contra-capa e etc. O pdf nos leva diretamente ao que interessa: as regras do jogo e como jogar.
Além dessas 13 páginas, temos as regras e descrições propriamente ditas. Não vale a pena - pois são poucas e são parte da explicação das regras - separar as regras e descrições de seus exemplos dados, todas serão contadas em conjunto. São elas:
- 3 para a introdução ao jogo (o que é, porque esse nome, o que é preciso para jogar, mecânica básica e quem são os personagens);
- 11 para a construção de Personagens (Habilidades, Raça e Classes);
- 9 para as Perícias;
- 17 para Talentos e Defeitos (sendo 11 com Talentos e 7 com Defeitos);
- 9 para Equipamentos (sendo 4 com armas, armaduras e escudos, e 6 para Mechas e Veículos);
- 11 para Combate (sendo 9 de regras e 2 sobre Escalas de Poder);
- 9 para Magias (regras e lista);
- 7 para o Mestre (sendo 2 descrevendo o mini cenário do jogo);
- e 7 para NPCs (regras extras para construção de personagens do mestre).
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Com um logo fofinho desses não tinha como não amar o sistema! |
Vejamos...
O maior capítulo do livro tem 17 páginas, com Talentos e Defeitos. Com isso, podemos dizer que o foco do jogo é a versatilidade dos Personagens. Diferentes problemas precisam de diferentes poderes para serem resolvidos, e tudo isso para criar personagens únicos e diferentes entre si.
E, de fato, essa variedade é uma premissa do jogo. Os Defensores são muito diferentes um do outro e sempre capazes de coisas diferentes; e esse número de páginas dedicadas a essa variedade justifica a premissa. Soma-se a isso 11 páginas com explicações sobre as Habilidades, Raças e Classes e temos um jogo com o maior número de páginas voltadas aos Personagens - sejam eles do Jogador ou do Mestre (o mesmo material pode ser utilizado em ambos os casos). Sem contar as 9 páginas de Magias e 6 páginas de Equipamentos.
Um detalhe interessante sobre o Conjurador é que ele não recebe tantos Talentos adicionais quanto as outras Classes. Depois, Marcelo Cassaro - o criador de 4D&T - disponibilizou o livro Manual da Magia 4D&T, com algumas opções para Personagens, mas mais opções para Conjuradores. Levando isso em conta, a Classe mais "fraca" do jogo agora está balanceada, com diversas novas Magias, Talentos, Defeitos e variações de Classes para deixá-los mais versáteis e coloridos.
Não entrarei na discussão dos Mechas e Veículos ganharem mais páginas que os Equipamentos, pois duas dessas páginas são como novos Talentos para as máquinas, e isso deixa as coisas balanceadas. Logo, Armas e Armaduras são tão importantes quando Mechas e Veículos.
Em segundo lugar, temos 9 páginas sobre Combate. Veja que o nome do capítulo é "Combate" e não "Regras Gerais" ou algo do tipo, então, somos sugestionados que o foco do jogo é o combate! E, pudera, para um jogo baseado em Anime/Mangá, Tokusatsu e Video Game, sabemos que a maioria do tempo de tela do show é tomado por combates dos heróis contra os vilões.
O combate é dito como um dos principais pilares de jogos d20, unindo-o aos pilares da exploração e da socialização; por isso, fora do combate, regras pontuais são encontradas em outros capítulos, como o Capítulo Perícias, por exemplo, que contém exemplos e regras sobre demandas que podem cumprir e quando e como testá-los.
Além disso, o Capítulo Mestre, com 9 páginas, deixa bem clara a função do Mestre no jogo: fornecer diversão e um bom direcionamento de regras.
Mesmo sendo um jogo de 2006, dito ultrapassado, não seguindo novos padrões e modos de jogo dos tempos atuais, mesmo para jogos d20, temos nesse Capítulo ótimas lições de sabedoria. É dito sim que o Mestre tem poder total sobre o jogo e o que acontece no cenário, e que suas decisões não podem ser contestadas. Porém, RPG não é um jogo de Mestre versus Jogadores, e sim de Mestre com Jogadores, trabalhando juntos para criarem uma boa história, com altos e baixos, risos e frustrações, mas sempre com bom senso e consentimento de ambas as partes.
Ainda no Capítulo do Mestre temos algo interessante: 2 páginas para um mini cenário!
E este mini cenário retrata muito bem as cidades das mídias orientais: um lugar rico e colorido que vive sendo ameaçado por vários vilões e sempre com motivos diferentes. E ainda com 7 páginas extras para criação de personagens para povoar essa cidade com cidadãos, bandidos, monstros bucha de canhão, generais, monstros e vilões.
O que manda nesse cenário é a imaginação do Mestre e os pitacos que o grupo dá com a criação da história de seus Defensores, tornando cada campanha única e especial, com ambientes sempre diversos e nunca explorados. A continuidade desse cenário com estes Defensores, ou seus aprendizes, ou mesmo novos, depende apenas da decisão da mesa de jogo.
Sem deixar de falar sobre nenhum capítulo, chamo a atenção dos leitores para as caixas pretas destacadas em alguns capítulos. Nelas vemos as dicas que o autor nos dá sobre como usar o 4D&T em conjunto com outros jogos d20. São textos rápidos e claros, que nos levam a conclusão de que toda essa adaptabilidade é possível, basta querermos e gastarmos um pouco de tempo para adaptar isso.
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Uma das artes dentro do 4D&T. Só pra mostrar que quanto mais bizarro, mais divertido! |
Eu, particularmente, gosto muito dessa parte! É muito legal ver as possibilidades que jogos como D&D 3.5 e Tormenta RPG podem trazer para o 4D&T. Imagina só jogar com um Youkai Clérigo do Panteão ou mesmo um Qareen Conjurador Piloto de Mecha!!! É incrível! Mas claro que essa adaptação leva um tempo para ser feita; é necessário adequar o nível de poder das raças e os níveis das classes e magias para o 4D&T,tirar coisas de um jogo de 20 níveis e transformá-las para 10 níveis.
Isso, infelizmente, é uma faca de dois legumes. Muitos têm preguiça de fazer, ou o saudosismo de preferir jogar as coisas como elas são, sem adaptações. Particularmente, prefiro jogar adaptando material, mas não tiro a razão de quem não gosta disso. E sempre quando eu mestro 4D&T, deixo isso em aberto, faz quem quer. E quem quiser, eu ajudo! Tudo em prol da cor do jogo!
Para terminar...
As Regras de Combate não comportam todas as situações possíveis dentro do jogo, são as regras mais básicas e simples sobre o assunto, existente em todo jogo d20. E para o tom porradeiro, que é a proposta do jogo, senti falta das Manobras de Combate. Mas como as Caixas Pretas nos dizem, podemos trazer regras de outros jogos d20 para 4D&T, logo, se você conhece essas regras de outro jogo, pode usá-las aqui.
Também senti falta de algo parecido com o Fraquejamento, mas para Fortalecer os Defensores. Claro que existem Escalas de Poder e Magias de suporte, mas elas estão fora da curva e nem todo Personagem possui acesso; faltou algo permitido pelas próprias regras do jogo.
Já ouvi dizerem que o sistema de Classes não condiz com a proposta do jogo, pois em cenários focados em combate - ou anime/mangá e tokusatsu - o Conjurador e o Especialista ficariam sempre atrás. Mas eu discordo. Como dito no começo, temos cerca de 55 páginas (mais de 50% do livro) sobre personalização de Personagens. Mesmo um Especialista pode ser mais letal em combate que um Combatente, ou um Conjurador pode causar mais dano que um Combatente. Basta fazer suas escolhas com sabedoria, aceitando suas limitações e fazendo delas sua força - como acontece nas obras imaginadas para este jogo.
Também acho falha a precariedade do sistema de Equipamentos! Dinheiro é opcional, concordo, mas apenas Armas, Armaduras, Mechas e Veículos não comportam o arsenal de um Defensor. Senti falta dos kits de ferramentas, gadgets, bugigangas e tralhas do dia a dia que ajudam os Defensores a enfrentarem seus problemas. Mesmo com os Itens Mágicos do Manual da Magia, isso não foi sanado. Para corrigir isso, apenas uma página bastava. Bastava adaptar as regras de equipamentos da versão mais antiga do sistema, o próprio D&T (da capa do Goku com cabelo de banana), ou criar uma lista de itens consumíveis e que concedem bônus em testes diversos.
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Logo que vi o sistema, já deu vontade de jogar isso aqui! Uma arma, punhos e muita força de vontade! Um RPG não precisa de regras rebuscadas pra cumprir seu papel! |
Apesar de todas essas falhas e de tentar corrigi-las com o Novva Tokyo DLC, ainda gosto de jogar o sistema do jeito cru dele. Não dando importância para crocância, apenas para o sabor que a experiência do jogo proporciona.
Além de sempre optar por esse jogo por conta dessa atmosfera aventuresca e porradeira, gosto dele pelo alto grau de adaptação que podemos fazer. Lembro que uma vez dei a um Defensor o Nível 0 de Poder Divino - do livro Divindades & Semideuses do D&D 3.5. Usei esse Personagem num evento. E mesmo sendo um Personagem virtualmente indestrutível, foi com o qual mais gostaram de jogar, pois, ele tinha tantos problemas que chegava a ser divertido e frustrante ver o equilíbrio entre seus sucessos e fracassos. Isso tudo sem tirar o brilho dos outros personagens.
Então, digo que 4D&T é um jogo no qual representamos heróis altruístas de diversas origens, que usam seus diversos poderes para proteger civis inocentes e enfrentar vilões que atacam uma grande cidade de aspectos tão diferentes quanto os próprios Defensores e vilões que a populam. E por diferente/diverso entenda: a gosto e imaginação daqueles que participam do jogo.
Com esse artigo não quero que mude sua opinião sobre o jogo, apenas compreenda que, assim como a amada versão d20 do seu cenário favorito, 4D&T é o d20 sem complicações para Animes, Tokusatsu e afins. Entendo que esteve frustrado por jogar uma campanha de 4D&T e não ter encontrado subsídios para situações inesperadas. Mas lembre-se das caixas pretas. Você pode adaptar novas regras de outros jogos d20! E, no final, assim como faz nos seus jogos d20 favoritos: crie suas regras! Se você faz lá, porque não pode fazer aqui?
Num próximo artigo, pretendo descrever como faço minhas adaptações de regras de outros jogos para este, sem desbalancear os níveis de poder. Além de dizer o que permito e o que não permito!
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Eu nunca joguei 4D&T, mas caso um dia jogue, este será meu Defensor! |
Este artigo foi escrito por mim e revisado pelo 1kton Diogo! Brigadão, mano!